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Audiências Públicas: afinal, qual a sua finalidade?

 

E eis que a Defensoria Pública da União (DPU) ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal para anular decisão judicial que validou Audiência Pública, realizada em setembro de 2013, para discutir o projeto de implantação e o lançamento do edital da Linha Viva, via expressa urbana entre o Acesso Norte e o Aeroporto de Salvador, orçado em R$ 1,5 bilhão de reais[1].

Segundo a DPU, “houve nítida má-fé da administração local no intuito de cercear a participação da população local” na audiência pública. O cerceamento se deu, também, pela divulgação que só alcançou o Diário Oficial; pela localização da audiência ser distante, num ambiente que comportava somente 90 (noventa) pessoas, o que dificultava o acesso e a participação dos interessados; e pela ação de policiais militares e guardas municipais, que impediam o acesso da população ao local onde era realizada a audiência.

Neste sentido, foi requerida a nulidade da audiência, já que não foram respeitados os ditames contidos no artigo 39 da Lei 8.666/1993 e tampouco o “princípio da participação da sociedade na gestão da administração pública”.

Mas, afinal, qual a finalidade e sentido da Audiência Pública? Para o STF, conforme regimento interno, a finalidade é de “ouvir o depoimento de pessoas com experiência e autoridade em determinada matéria, sempre que entender necessário o esclarecimento de questões ou circunstâncias de fato, com repercussão geral e de interesse público relevante, debatidas no Tribunal”. O relator poderá decidir, de forma irrecorrível, sobre a manifestação de terceiros. Ou seja, a escolha para a audição dos interessados está submetida ao crivo discricionário do relator.

A Audiência Pública tem o fim de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de abertura de arena dialógica e a atuação conjunta entre a instituição e a comunidade, promovendo a participação social por meio de depoimentos de pessoas com experiência e autoridade, em suas várias vertentes. O objetivo específico é, também, de esclarecer as questões técnicas, científicas, administrativas, políticas, econômicas, sociais envolvidas no caso que será apreciado, seja pela administração, pelo legislativo ou pelo judiciário.

A participação para além de descobertas de “novos sentidos” acaba por ampliar o debate, visto que a afetação de uma política pública, lei ou decisão judicial acaba por permear todo o ambiente coletivo. Outra questão importante é a possibilidade de concretização de um direito por meio de escolhas democráticas.

Pretende-se, desta forma, o diálogo institucional responsável, estendendo os espaços de consenso e dissenso, de modo a viabilizar pelo menos, alguma uniformidade básica de opiniões para soluções compartilhadas.[2]

Assim, o ambiente é absolutamente democrático, incluindo a participação da comunidade. Permite-se a abertura para a audição, memoriais, artigos ou documentos. Unem-se os conhecimentos técnicos e práticos para favorecer o esclarecimento das razões que serão objeto da Audiência Pública. O significado é institucional, constitucional, social e democrático!

Mas como é feita a escolha dos participantes? Como deve ser fundamentada a resposta após a realização da Audiência Pública? Estas são questões ainda encobertas: o silêncio das respostas e o afastamento das expectativas deliberativas[3]

A deliberação e a fundamentação racional podem se apresentar como uma substituição de uma forma mais direta de legitimidade democrática. Os destinatários de persuasão racional compreendem não só aqueles diretamente participantes da decisão, mas todos aqueles que possam dar aplicação ou sofrer os efeitos dela, eventualmente rematizando o antes decidido em novos problemas de interpretação constitucional[4].

Se o processo democrático deliberativo, de outra forma, se dá, “a partir do reconhecimento da necessidade específica de uma ampliação dos atores que subsidiam a formação do convencimento – e esta é uma escolha observado um especial ônus argumentativo – não se pode desconhecer que a deliberação externa passa a contar com destinatários especiais do caráter persuasivo dos argumentos”, ou seja, aqueles que primeiramente foram convidados a participar do exercício argumentativo[5].

A prática de abertura da arena dialógica constitui um elemento de suma importância para a prática do exercício democrático – intercambiando os elementos que ajudarão na construção da decisão que ao final produzirá resultados coletivos.

Não se pode travestir a audiência pública como prática de exercício democrático, simplesmente “invocando seu nome”. Eis algumas razões: existiria fundamentalidade na escolhas, ou seja, as respostas apresentadas por aqueles que convocaram a audiência afastariam por completo as opiniões dos atores envolvidos?; existiria o cerceamento dos atores envolvidos, ou seja, quem estaria apto à participação?; se as respostas apresentadas após a audiência não forem fundamentadas, esta falta de justificação seria ato democrático?; dentre outras…

Disso não decorre um dever de vinculação ou subordinação ao que venha a ser trazido pelo diálogo social, mas certamente gera um dever de considerar essas atribuições, para incorporá-las ou descartá-las[6].

A Audiência Pública não pode servir e nem ser um “evento simbólico”, deve ser uma ferramenta que incite a arena dialógica a uma prática que efetivamente aperfeiçoe o exercício da democracia deliberativa.