Conflito de Poderes instala cenário de instabilidades no país
Por Manuela Damaceno (DRT-AM 0172)
“Estamos diante de um confronto entre o que chamaria de mutirão da corrupção e mutirão do Sistema de Justiça. São dois lados que se digladiam na perspectiva de uma vitória nesse embate sem trégua”, declarou o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto durante abertura oficial da Semana do Ministério Público 2016 em Salvador. Ayres Britto, ao lado da procuradora-geral de Justiça Ediene Lousado e do ex-PGJ Wellington César Lima e Silva, falou para procuradores e promotores de Justiça, juízes, defensores públicos, servidores e demais autoridades sobre o conflito de poderes instalado no país e os aspectos que norteiam a ‘Lava-jato e as complexas relações interinstitucionais’.
Ao abrir o evento, Ediene Lousado apontou o contexto atual de ataques às garantias e prerrogativas pessoais e institucionais do Ministério Público e conclamou todos a unirem forças, olharem para o passado e fixarem os olhos para a construção do futuro. “O MP se notabilizou pelo compromisso de defesa e promoção de uma sociedade mais justa e solidária, como pretendida na Constituição Federal. Se os tempos presentes são sombrios, a nossa base é segura, construída sob rochas e, por isso, estamos seguros para passarmos a tempestade”. Ela destacou que o parquet baiano seguirá firme na luta pelas conquistas democráticas alcançadas ao longo do tempo. “Se de um lado são impostas medidas de racionalização econômica e financeira, se surgem restrições às nossas atribuições, por outro lado temos segurança para que nosso lastro firme e nossa ideologia de afirmação dos direitos fundamentais e sociais trabalhem de modo intransigente na defesa do povo, do Brasil e da Bahia, aguardando a bonança que com certeza virá”, registrou a procuradora-geral.
Na mesa de debate, o ex-ministro Ayres Britto diagnosticou o cenário brasileiro como de confronto e o fenômeno da Lava-Jato como um “concerto cidadão rigorosamente legítimo, jurídico e de instituições impeditivas do desgoverno”. Segundo ele, o desgoverno chegou ao seu limite de insuportabilidade no Brasil, a partir do assalto “sistêmico, insolente, sistemático, atrevido e endêmico ao erário público”. “Parece que a população brasileira está saindo meio que perigosamente de um quadro elogioso, virtuoso de pluralismo social genérico e pluralismo cultural, afunilando para o pluralismo político e ideológico, saindo desse campo para o divisionismo, que é o do fechamento do diálogo”. Contudo, ele reforça a necessidade de instituições empoderadas, como o Ministério Público, robustecerem-se ainda mais das prerrogativas constitucionais para mudar o quadro nacional efervescente, politicamente instável, economicamente preocupante e eticamente deteriorado. “O MP como instituição permanente tem tríplice finalidade, única no mundo, de defender o regime democrático, a ordem jurídica brasileira e todos os direitos sociais e individuais indisponíveis”.
Durante o evento, o jurista Luís Flávio Gomes, em vídeo, justificou a ausência por motivo de saúde e fez uma breve retrospectiva sobre a operação Lava-jato, que tem hoje 118 réus condenados. Ele registrou que a dimensão da operação se dá por conta do empoderamento das instituições ao utilizarem as forças dadas pela Lei, fortalecendo a democracia. “São princípios, eixos que norteiam todo o bom funcionamento de uma estrutura pública. Não há ninguém no estado democrático de direito que possa fazer o que bem entende, existem poderes limitados, todas as instituições têm seus limites. Esse é um ponto fora da curva que está perturbando o poder corrupto e questionando o sistema”, afirmou. O ex-procurador geral de Justiça Wellington Lima e Silva apontou o momento singular e desafiador que o país atravessa. “Se a Constituição federal consigna ao MP a tarefa da persecução, entre outras, e ao Judiciário a tarefa de julgar, não é possível que, por via oblíqua, nós tenhamos o risco de criminalizar a própria atividade naquilo que ela tem de mais característico, sob pena de amputarmos a liberdade que os integrantes dessas instituições precisam ter no desempenho de suas tarefas”. Para a presidente da Associação do Ministério Público do Estado da Bahia (AMPEB), Janina Schuenck Brantes Sacramento, “hoje é um dia para pensarmos sobre a formação de nossa instituição, do perfil institucional, e tudo que vem sendo feito para que ele seja desfigurado. Infelizmente, interesses nada republicanos, através de ações pouco democráticas, veem tentando desfigurar, tolher, asfixiar a nossa instituição e as reações surgem em virtudes de nossos acertos”.
A mesa de abertura do evento, foi composta pela PGJ Ediene Lousado; ministro Carlos Ayres Britto; desembargadora Regina Helena Ramos Reis, representando a presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia; corregedor-geral do MP, Marco Antônio Chaves; procurador-chefe do MP do Trabalho da 5ª região, Alberto Bastos Balazeiro; procurador de justiça Militar, Samuel Pereira, representando o procurador-geral de Justiça Militar; procuradora-geral adjunta do Estado, Luciane Croda, representando o Governo; subdefensor público-geral, Rafson Saraiva Ximenes, representando o defensor público-geral; presidente da Ampeb, Janina Schuenck e o coordenador do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional do MP, promotor de Justiça Adalvo Nunes Dourado Júnior.